Pensar Piauí
Doutor em Antropologia

Arnaldo Eugênio

Doutor em Antropologia

A lei à moda da causa

Foto: Montagem pensarpiauiDom Expedito Lopes
Dom Expedito Lopes

Na última sexta-feira (01/03), a população de Dom Expedito Lopes-PI foi surpreendida com uma decisão monocrática do ministro Nunes Marques do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que suspendeu as eleições suplementares marcadas para o próximo domingo, dia 3 de março. Além de determinar o retornou imediato aos cargos de prefeito do município Valmir Barbosa e ao de vice-prefeita, Evanil Conrado.

Intencionalmente, indiferente ao contexto sociopolítico que se desenrola no município, na decisão, o magistrado alega que “o TRE se utilizou de prova ilícita para decidir pela cassação dos mandatos e atendeu, dessa forma, ao pedido da defesa da chapa que teve os diplomas cassados pela Justiça Eleitoral do Piauí”.

Primeiro, para os formadores de opinião de Dom Expedito Lopes e observadores externos, a prova utilizada é explicitamente lícita, e de amplo conhecimento popular local, para os réus terem sidos cassados por decisão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e afastados dos cargos em 14 de dezembro de 2023.

Segundo, estranhamente, desde a quarta-feira (28/02), quase 72 horas antes, a decisão monocrática do ministro Nunes Marques do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já estava sendo antecipada e compartilhada nos grupos de redes sociais locais. Ou seja, que o magistrado iria atender ao pedido da defesa da chapa que teve os diplomas cassados pela Justiça Eleitoral do Piauí.

A principal alegação dos nativos para a tamanha certeza jurídica sobre a decisão monocrática que viria é a proximidade política dos “cassados” com os responsáveis pela indicação de Kassio Nunes Marques à vaga do ministro Celso de Melo no Supremo Tribunal Federal (STF), ou seja, o Senador Ciro Nogueira e o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Além disso, são unânimes em afirmar que a decisão foi política, oportunista e intencional, pois a cidade já estava mobilizada, o período de campanha já se encerrava, os eleitores estavam prontos, o policiamento se fazia presente e os locais de votação definidos. Mas, que a maior motivação para suspender a eleição estava no fato de que o candidato Joaquim do PT, segundo uma enquete popular realizada na sexta-feira, tinha a preferência de quase 70% das intenções de votos. E seria o primeiro prefeito do PT em Dom Expedito Lopes.

Em se comprovando a tese nativa, estamos diante de uma situação jurídica casuística com togamento político, que tem sido, ao que parece, recorrente no Brasil. Noutras palavras, quando a lei é aplicada à moda da causa, ou seja, me diz quem é o acusado e o provável crime que te direi, antecipadamente, qual a possível sentença.

Assim, a visão dos formadores de opinião locais e dos observadores externos sobre a prévia divulgação nas redes sociais da decisão monocrática do ministro Nunes Marques em suspender a eleição suplementar em Dom Expedito Lopes, para além da conveniência política local, nos remetem à noção de judicialização da política – ou, de outro modo, a lei à moda da causa.

Isto é, um fenômeno jurídico que apresenta quatro eixos definidores: 1) o aumento do impacto de decisões judiciais em causas políticas e sociais; 2) o processo em que os conflitos políticos são judicializados; 3) o nível pelo qual a legitimidade de um governo é continuamente construída junto da percepção da sociedade da capacidade e credibilidade de se manter o Estado de direito e proteção de direitos; 4) o uso do sistema judiciário por agentes e grupos políticos para manipular e satisfazer os próprios interesses políticos, sociais e econômicos.

OBS: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do pensarpiaui.

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